Refletindo Sobre O Papel Das Brincadeiras Na Educação Infantil
“O brinquedo da criança é um organismo vivo,
a manifestação à inteireza da inteligência com o corpo,
da sensibilidade, da cidadania.”
Lydia Hortélio, Crianças e Jovens no Século XXI, pág. 24, São Paulo, 2013
Bola de Meia, Cinco Marias, Corre Cotia, Amarelinha, Duro ou Mole, e tantas outras brincadeiras, ou brinquedos, como diz Lydia Hortélio, que foram tão presentes na vida dos avós, hoje correm o risco de se perderem da memória da geração atual pelo acesso e, porque não dizer, pelo excesso de interações e jogos virtuais e digitais.
Diante da projeção dos equipamentos modernos, como tablets e notebooks, o patrimônio imaterial contido nas brincadeiras da infância precisa ser oferecido às crianças por alguém que compreenda seu valor e, em nosso entender; assim, este passa a ser papel fundamental da escola.
O imenso repertório de brincadeiras de nossa cultura, por si só, abriga enorme quantidade de conteúdos, que estão ali, eternizados, por rememorarem a luta do ser humano para se constituir como espécie: escolher e ser escolhido, driblar obstáculos, adivinhar segredos, montar estratégias, encontrar o que está escondido, saber se esconder, ser veloz, ter agilidade corporal, entoar canções, enfrentar os medos etc.
As brincadeiras auxiliam na constituição psíquica dos indivíduos; e, por isso, precisam ocupar lugar privilegiado na infância.
Atividades Para Educação Infantil, crianças de três anos
“O deslumbramento é essa emoção sutil que nos põe
em alerta para procurar os significados importantes das coisas
que vemos, sentimos, ou reconhecemos.”
Alfredo Houyelos, A Estética no Pensamento e na
Obra Pedagógicade Loris Malaguzzi,
pág. 125, São Paulo, 2020
Aos três anos, as crianças manifestam ativa curiosidade para os fenômenos do entorno; já detêm autonomia nos deslocamentos, e têm aguçada a percepção de detalhes sutis. Elas estão em plena capacidade para deslumbramentos; põem-se assim, diante de coisas pequenas do cotidiano. Algumas propostas são particularmente atraentes para os pequenos: brincadeiras e jogos que envolvam o corpo e os movimentos, ou que tenham como tema a luz e sombra, ou que envolvam elementos naturais como água, terra; enfim, a vida dos animais.
São também valiosas as atividades que tragam para próximo das crianças os elementos da cultura, como as artes, em rodas de apreciação e ateliês de produção, ou propostas que aproximem o universo musical dos pequenos, de maneira lúdica e livre.
Aos três anos, as crianças estão ávidas por conhecerem sobre como as coisas funcionam, e seu repertório de vocábulos se encontra em expansão. Por isso, bons livros, leituras e narrativas de qualidade precisam estar no cardápio diário da escola.
Além destas, as brincadeiras que permitem às crianças aprenderem o manuseio de diferentes tipos de instrumentos, pentes e escovas, tesoura, bambolê, funis, peneiras, lupa, e utensílios próprios da refeição são fundamentais para apoiar o agir independente dos pequenos.
A presença constante do educador próximo às crianças, neste universo de interações, movimento e brincadeiras, tem como função principal auxiliar as crianças a externarem suas emoções e a se apropriarem das regras de convivência, uma vez que começam a aprender sobre o ponto de vista do outro, sobre negociação, e sobre respeito.
Atitude curiosa, brincadeira em ambientes bem preparados, e a escuta atenta do educador para a voz da criança são pilares na construção de conhecimentos entre os pequenos.
Projetos para Educação Infantil
“Cada tema pode surgir numa circunstância diferente:
a visita a uma exposição, uma questão apresentada pela imprensa ou pela televisão, um debate na sala de aula, um tema que o professor considere necessário estudar. A problematização do tema é uma tarefa-chave, pois abre o processo de pesquisa. Essa situação leva em conta não só o que os alunos sabem (ou acreditam saber), mas sim o contraste com evidências que questionam e põem em conflito seus pontos de vista.”
Fernando Hernandez, Transgressão e Mudança na Educação, pág. 84, Porto Alegre, 1998
O protagonismo da infância é reconhecido em boas propostas pedagógicas da atualidade. Ouvir a criança, compreender como ela pensa, e dar materialidade aos seus projetos e ideias passou a ser o desafio principal das escolas de abordagem construtivista, em contraposição a outros modos de lidar com o ensino, onde os conteúdos ocupam a cena principal, e devem ser absorvidos por todas as crianças, independentemente de suas posições frente à vida. Na UNIEPRE, um dos pilares, desde a educação dos bebês, é a autonomia, construída a partir do respeito à criança e às suas necessidades e possibilidades.
A opção pelo trabalho com projetos entre as crianças maiores é uma escolha que reconhece o protagonismo das crianças, e valoriza os seus saberes. Os projetos permitem criar redes de significados e criam sentidos pessoais para cada criança, à medida que aprofundam reflexões sobre temas e a própria vida da criança. Os projetos têm como espinha dorsal as questões elaboradas e as hipóteses que as crianças constroem, à medida que a interação com o tema evolui.
Atividades Para Educação Infantil, Crianças De Cinco Anos Entrando Em Contato Com Conceitos Matemáticos
“A Educação Infantil precisa promover experiências nas quais as crianças possam fazer observações, manipular objetos, investigar e explorar seu entorno, levantar hipóteses, e consultar fontes de informação para buscar respostas às suas curiosidades e indagações. Assim, a instituição escolar está criando oportunidades para que as crianças ampliem seus conhecimentos do mundo físico e sociocultural, para que possam utilizá-los em seu cotidiano.”
Base Nacional Comum Curricular, pág. 43, Brasília, 2017
Projetos, ou sequencias de atividades podem selecionar e propor brincadeiras que permitam às crianças construírem uma estrutura de relações abstratas entre objetos concretos, promovendo o pensamento matemático. No cotidiano da escola, são diversos os momentos em que as crianças se deparam com problemas envolvendo distância, tempo, quantidades. Enquanto brincam com jogos de percurso, de tabuleiro, jogos com dados, boliche, jogos com cartas do tipo Super Trunfo, as crianças constroem operações mentais entre o abstrato e o concreto; entre os elementos dos jogos em suas mãos e as abstrações que realizam.
Educação Infantil em Tempos de Pandemia
A pandemia retirou o chão de todos nós, das famílias, das crianças, das escolas. No entanto, o tempo de afastamento permitiu que todos pudéssemos revisitar valores e traçar novos rumos. Os protocolos de segurança sanitária, que sempre foram a marca registrada da UNIEPRE, passaram a ser condição para a reabertura.
O retorno às aulas, com protocolos seguros, tem sido comemorado pelas crianças, pelas famílias e pela própria escola. O sentido se refaz, o motivo se reafirma: escolas são espaços de infâncias. A infância bem vivida é aquela constituída no encontro de crianças, nas brincadeiras compartilhadas, nos valores adquiridos ao dividir um brinquedo, ao construir em grupo uma cabana, ao competir em um jogo de bola, ao cuidar do amigo que cai, ao ser escolhido no corre-cotia. Fora do encontro é difícil pensar em infância feliz.
Educação Infantil à Distância, o que seria isto?
Mais do que nunca, a educação infantil se reafirma como presença, como interação e corporeidade de crianças que se encontram consigo mesmas, com seus pares, com a natureza, e com os objetos da sua cultura, mediados por adultos presentes, em ambientes intencionalmente organizados para lhes oferecer o que de mais valioso a humanidade constituiu: as relações de afeto.
A distância imposta pela pandemia criou a necessidade de a escola pensar formas artificiais de conseguir alguma proximidade afetiva, sustentando vínculos fundamentais para o desenvolvimento saudável dos pequenos. As alternativas pensadas amenizaram o impacto da ausência: atividades levadas em casa, alimentos preparados na escola indo para as suas mesas, canais de comunicação por tela, criados para contação de histórias, para proposição de brincadeiras, para atividades envolvendo o pensar sobre escrita, etc. Mas, a cada alternativa criada, mais fortalecia a convicção de que nada substitui a presença nessa escola, nessa nossa escola, que, há 32 anos, chama-se carinhosamente por todos UNIEPRE!
Marilene Negrini
Coordenadora Centro de Formação Uniepre